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More than words.

More than words.

Recovery - 01

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Quando perdemos alguém, uma parte de nós vai embora com essa pessoa. Ficamos um pouco mais vazios e esse vazio magoa. Por mais pequeno que possa ser, a sua dor é enorme. Mas quando essa pessoa é o ser mais importante na nossa vida, a pessoa que mais amamos e aquela sem a qual não conseguimos imaginar a nossa vida, essa dor é para lá de infinita. Trespassa-nos, faz-nos gritar, chorar, querer morrer também. Faz-nos desejar ter morrido no seu lugar, pois acreditamos que tudo seria melhor caso isso tivesse acontecido.

As vozes na cabeça de Valerie pareciam vir de um lugar muito distante dali, mas, infelizmente, estavam mais próximas do que ela gostaria. Os sussurros daquelas duas pessoas que partilhavam o carro com ela, passavam-lhe ao lado e ela não ouvia nada do que proferiam. A sua cabeça estava preenchida com vários pensamentos, todos eles dirigidos para Ivy, a sua irmã gémea, morta.

- Morta. Morta. Morta. Está morta… - Valerie murmurou estas palavras num tom de voz tão baixo, que ela quase podia jurar que apenas as tinha proferido em pensamento.

Mesmo passado um ano, aquilo continuava tão presente na sua cabeça como se tivesse acabado de acontecer. Nunca conseguimos lidar com a morte da pessoa mais próxima de nós, e por mais que nos digam que o tempo cura tudo, isso não é bem verdade. Existirá sempre um vazio no nosso coração, sempre uma palavra, um objecto, uma memória, qualquer coisa, que por mais pequena e insignificante que possa parecer, fará a dor reavivar-se.

O problema para Valerie, era que ela via em todo o lado qualquer coisa que lhe fazia recordar a irmã.

Fora por este motivo que a rapariga tinha decidido que queria desistir da vida. Nada mais fazia sentido para ela. Ela não queria mais sorrir, não queria mais ter de fingir que estava feliz quando por dentro estava completamente quebrada. Estava cansada de ter sempre todas as pessoas a falar-lhe como se nada tivesse acontecido. Como podiam fingir que tudo estava bem? Cerca de um mês depois de Ivy ter morrido, Valerie tinha começado a tentar, de várias formas, acabar com a sua vida. Queria simplesmente morrer. Queria estalar os dedos e estar morta, mas infelizmente, não era tão simples quanto isso.

A primeira coisa que fez, foi marcar a pele pálida dos seus braços com os cortes que fazia com uma lâmina. Talvez se fizesse aquilo muitas vezes, todo o sangue do seu corpo saísse de si, deixando-a então sem vida. Mas ela sabia que não era assim que acontecia, aquilo apenas a tornava fraca, tão fraca que os seus olhos mal se aguentavam abertos, no entanto, o seu coração continuava sempre a bater. Este ato repetiu-se, tantas vezes, que já nem ela própria as conseguia contar. Por mais que tentasse esconder isto dos pais, não resultou durante muito tempo. Quando eles descobriram, uma tarde em que Valerie tinha ficado desmaiada na casa-de-banho do seu quarto, logo a levaram para o hospital. Pensavam que isso e o facto de a rapariga começar a frequentar um psicólogo, iria resolver tudo, mas estavam completamente enganados. Nada do que fizessem a ia fazer desistir do seu principal objectivo.

Valerie já não queria saber de nada, os amigos estavam esquecidos num pequeno recanto da sua mente. Ela não queria amigos, para quê tê-los se mais cedo ou mais tarde os ia perder? Para quê esperar pelo sofrimento quando o podia evitar logo à partida?

As suas tentativas de acabar com a vida, prologaram-se, mês após mês. Para além dos cortes, ela começou a tomar uma série de comprimidos de uma só vez. Mas nada daquilo a matava, os pais encontravam-na sempre e as lavagens que no hospital lhe faziam ao estômago, mantinham a rapariga viva.

Este ciclo repetia-se e Valerie ignorava todos os avisos dos pais, aliás, nada do que eles diziam parecia entrar na sua cabeça.

O carro parou de andar, e olhando pela janela, a rapariga vislumbrou o enorme edifício que se estendia para lá da estrada. O céu cinzento, repleto de nuvens escuras, faziam a fachada daquele lugar parecer mais assustadora do que realmente era.

- Valerie? – a voz da mãe despertou-a daqueles devaneios e Valerie escondeu o diário na sua mala, embrenhando-o no meio das suas roupas.

A sua mão dirigiu-se à maçaneta da porta e logo abriu esta. Suspirou quando colocou ambos os pés no alcatrão e desejou com todas as forças que aquilo não fosse verdade. Os seus pais não podiam estar a fazer-lhe aquilo. Não podiam.

Depois de ingerir mais uma enorme quantidade de comprimidos, que a levaram ao hospital, em conjunto com os médicos, os pais de Valerie decidiram que o melhor para ela, era ser internada num hospital psiquiátrico. Segundo eles, as suas tentativas de suicídio começavam a ser exageradas e percebendo que não conseguiam evitar aquilo, decidiram mandá-la para aquele lugar. Onde estaria praticamente vinte e quatro sobre vinte e quatro horas vigiada.

- Bem-vindos a Saint Anne. – proferiu uma senhora, já com alguma idade, as suas rugas agora mais expostas devido ao sorriso que se desenhava nos seus carnudos lábios.

Valerie não sabia como tinha chegado até à porta daquele edifício, visto não se lembrar de ter percorrido os metros que separavam o carro da porta daquele lugar.

- Obrigada. – a voz da mãe foi a seguinte a pronunciar-se e depois de mais uns quantos cumprimentos e palavras amigáveis, os quatro adentraram numa das divisões.

Na sua cabeça, apenas pessoas que estavam malucas eram internadas em lugares como aquele, e magoava-a imenso saber que os pais a viam como tal. Não valia a pena fingir que estava satisfeita com aquelas decisões, porque não estava. Da sua boca ainda não havia saído uma única palavra desde que tinha acordado naquele dia, e ela pretendia que assim continuasse.

Cerrou os dedos na mala que estava numa das suas mãos, a qual continha as poucas coisas de que iria necessitar ali. Os seus olhos azuis percorreram o máximo que puderam daquele lugar, tentando absorver tudo o que a rodeava, mas nada disso tinha importância para ela. Ela só queria ir embora.

- Depois voltamos para te visitar. – Valerie nem sequer tinha dado pela passagem do tempo, pois quando a sua atenção se voltou para as pessoas que estavam ali com ela, os pais estavam já a despedir-se.

Ela não sabia dizer ao certo o que aconteceu a seguir, isto porque a sua cabeça estava uma total confusão. Viu os pais despedirem-se, os sorrisos de conforto nos seus rostos, as palavras queridas que saiam dos seus lábios, mas as quais Valerie já nem sequer se lembrava. Viu os dois abandonarem aquele lugar, deixando-a para trás. Ela só queria gritar com eles, insultá-los e perguntar-lhes porque estavam a fazer aquilo com ela. Ela não ia ficar bem, não ia. Aquilo apenas a ia matar aos poucos, de forma lenta e dolorosa. E ela só queria morrer da forma mais rápida possível.

O olhar de Valerie voltou-se de novo para aquela mulher, quando a sua voz se fez ouvir, uma vez mais. – Vamos? Vou levar-te ao teu quarto.

A jovem limitou-se a assentir com a cabeça. De seguida os passos de ambas começaram a soar no pavimento à medida que percorriam os corredores. Vários seguranças percorriam as várias divisões ali existentes, e aquilo fez com que Valerie começasse a ter mais noção de onde se encontrava. Os corredores, completamente pintados de branco pareciam não ter fim. Tudo era branco ali, e Valerie deu por si a achar que iria passar a odiar aquela cor.

Os seus olhos desviaram-se das paredes, para depois irem de encontro a uns cabelos claros que chamaram a sua atenção. O seu olhar desceu mais, tentado ver as feições daquela pessoa, apesar de os cabelos estarem ligeiramente caídos para a frente ela conseguiu na mesma reconhecer aquelas feições.

O olhar daquele rapaz elevou-se ligeiramente, e assim que os seus olhos esverdeados encontraram os da rapariga, ela teve a certeza que estava certa nas suas teorias mentais.

 

Aqui está o primeiro capítulo! Estava ansiosa de o publicar para vocês o lerem e me darem opiniões! Espero que tenham gostado e espero mesmo que gostem desta história. Estes capítulos iniciais são um bocado parados, como sempre, mas servem também para vocês conhecerem melhor as personagens.

Beijinhos

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