Recovery - 04
A claridade começava a entrar pelas janelas de todo aquele edifício. A chuva do dia anterior, tinha dado lugar a um dia bastante seco, mas cinzento, apesar de tudo. Quando os seus olhos se abriram, Valerie suspirou com o batuque que ouviu vindo do outro lado da porta do seu quarto. Estava sempre a ser vigiada, desde que ali tinha chegado, mesmo que tentassem mostrar-lhe que não estava, ela bem via os olhares que disfarçadamente estavam postos sobre ela.
Depois de murmurar um ensonado sim e se sentar sobre o colchão, coberto pelos lençóis de cor branca, a porta abriu-se e uma das enfermeiras entrou naquela divisão. Trazia um sorriso no seu rosto, como sempre acontecia, parecia que o tinham colado lá para nunca mais sair.
- Bom dia. – ela falou de forma animada e a Valerie, apenas lhe apetecia responder que era tudo menos um bom dia. Nunca seria um bom dia enquanto ela estivesse fechada ali dentro. Mas ao invés disso, ela disse o que a mulher mais velha estava à espera.
- Bom dia. – suspirou, de seguida, não deixando, no entanto, que o seu suspiro fosse audível.
A enfermeira colocou sobre a mesa-de-cabeceira os dois comprimidos que Valerie deveria tomar e depois colocou-se direita, os seus olhos atentos a perscrutar o rosto da jovem. Ela sabia o porquê de a mulher estar lá, estava à espera de que Valerie tomasse os comprimidos, pois tinha de se certificar de que estes eram ingeridos por ela, e não deitados ao lixo ou escondidos num qualquer lugar.
A rapariga pegou nos dois comprimidos, assim como no copo cheio de água que se encontrava ao lado deles. Levou os dois à boca, ao mesmo tempo, e depois bebeu a água, ajudando assim a ingeri-los. Assim que terminou, a enfermeira voltou a colocar um sorriso nos seus lábios e depois de se despedir, saiu do quarto.
Assim que ficou sozinha, Valerie revirou os olhos e cuspiu para a mão os comprimidos que tinha mantido num recanto da sua boca. Se pudesse evitar tomar aquelas porcarias, ela iria fazê-lo. Não queria tomar aquilo, não assim. Quem sabe os pudesse guardar a todos, um por um, até conseguir juntar uma boa quantidade deles para depois os ingerir de uma só vez. Este pensamento fazia um sorriso surgir nos seus lábios.
Guardou os dois comprimidos num lugar que ela esperava ser seguro e depois pegou numas roupas quaisquer que estavam já arrumadas, de forma cuidada, dentro do seu roupeiro. Dirigiu-se à casa de banho, a qual tinha de partilhar com outras pessoas, para seu grande desagrado. Entrou num dos cubículos destinados aos banhos, e nuns breves minutos, ela tomou um duche. Depois disso, voltou de novo ao seu quarto, caminhou até perto da cama e deixou o seu corpo sentar-se sobre a mesma. Afastou para trás os seus cabelos loiros, que estavam agora molhados e de seguida abriu uma das gavetas da mesa-de-cabeceira. Da mesma retirou o seu diário, abriu o mesmo, numa das páginas iniciais, e deixou os seus olhos azuis focarem-se nas letras.
“ 24 de Junho, 2014
Não consigo viver sem ti, juro que não consigo. Por mais que eu tente, é muito muito difícil. Deixei de querer sorrir, ou de ter sequer motivos para tal. Sinto-me tão sozinha, mesmo quando estou rodeada de pessoas. Nenhuma delas és tu.
No teu funeral, o pior dia de todos, as pessoas vinham falar comigo e com os nossos pais, diziam palavras queridas, para nos tentar consolar, mas sabes uma coisa? De cada vez que diziam algo, a minha vontade de chorar apenas se tornava maior. E chorei, chorei mesmo muito, ainda agora choro. E sei que vou sempre chorar. Há coisas às quais nunca nos conseguimos habituar, e a tua morte é uma delas.”
Engolindo em seco, ela voltou a fechar aquele pequeno caderno, as imagens daqueles dias voltaram à sua mente, e ela não queria que isso acontecesse. Sem contar o dia em que Ivy tinha morrido, o dia do seu funeral tinha sido o pior dia da sua vida.
Guardou o objecto de novo no mesmo sítio onde estava anteriormente, e depois disso abandonou o quarto, com a intenção de ir tomar o pequeno-almoço, apesar de a sua fome ser nula.
♣
Quando Ashton acordou nessa manhã, ele logo percebeu que não estava bem. Não estava como devia de estar, mas tentou não dar importância a isso. Talvez aquele mal-estar fosse apenas fruto da sua imaginação ou então os culpados eram os pesadelos que tinham ocupado parte da sua noite, pesadelos esses que se tinham agora transformado em pensamentos. Pensamentos que ele não estava a conseguir controlar, não estava a conseguir tirá-los da sua cabeça, e isso dava cabo de si. Mas, agora que tinha saído para o corredor, ele teve a certeza de que não era apenas sua imaginação. A sua respiração estava agora muito mais fraca do que devia, aliás, ele mal conseguia inspirar ar para os seus pulmões, as suas mãos tremiam e ele sentia o seu corpo ficar todo suado, para além das tonturas, que faziam com que tudo à sua frente ficasse baço. Tudo à sua frente parecia estar a desaparecer, e ele pôde sentir algumas lágrimas a correr pelo seu rosto, completamente descontroladas. Tão descontroladas como ele estava com o seu corpo, só queria manter-se focado em si, mas parecia algo completamente impossível.
As portas pareciam estar a mover-se, as pessoas ao fundo do corredor pareciam estar mais perto do que estavam na realidade. Os seus dedos deslizaram pelo cabelo e ele deixou-se escorregar pela parede até ficar sentado no chão. Cerrou os seus punhos, com força, sentindo as suas unhas curtas quererem espertar-se na pele da palma da sua mão. Tentou respirar normalmente, mas essa tarefa mostrava-se completamente difícil, ele pensava que a qualquer momento ia deixar de respirar por completo, e ia morrer, ali mesmo.
- Ashton? – ele apenas se apercebeu de que estava ali alguém, quando ouviu aquela voz. Uns dedos foram de encontro aos seus cabelos - os quais estavam colados à sua testa devido ao suor - e afastaram os mesmos para trás. – O que é que tens? O que se passa?
Ele deixou a sua cabeça cair para trás, fazendo esta ir contra a parede branca e de imediato os seus olhos encontraram os de Valerie.
A rapariga estava a olhar para ele, completamente confusa, pelo estado em que Ashton se encontrava. O seu corpo estava todo encolhido contra a parede, a tremer, o seu rosto suado e os seus olhos pareciam não conseguir focar nada à sua frente. Já para não falar na maneira como ele estava a respirar.
- Ashton, fala comigo! O que é que tens? – perguntou, de forma impaciente. – Tem calma. – pediu, sem saber o que mais fazer.
- Nada. – ele falou, de forma meio atrapalhada e ela teve de fazer algum esforço para conseguir entender as palavras dele.
- Calma. – pediu uma vez mais, e sentou-se ao lado dele. – Diz-me o que preciso de fazer… - tentou desta forma ajudá-lo, apesar de continuar sem entender o que se passava com ele.
- Nada. – ele falou de forma muito lenta, como se entre cada sílaba precisasse de arranjar algum ar que lhe permitisse continuar a falar.
Valerie engoliu em seco, permanecendo sentada ao lado dele, proferia algumas palavras, continuando a tentar descobrir o que se estava a passar com ele, mas da boca de Ashton não saia mais nada a não ser um baixo nada ou então ele limitava-se a ficar calado, com a sua respiração completamente descompassada. O estado em que ele estava começava a deixar Valerie realmente preocupada e sem saber o que fazer por ele.
Eu não digo neste capítulo, mas o Ashton está a ter um ataque de pânico, eu não queria estar a dizê-lo agora, mas sinto-me na necessidade de dizer algo em relação a isto. Não sei como é ter um ataque de pânico, nunca tive nenhum e não conheço ninguém que tenha tido. Por isso para escrever isto eu apenas me baseei em coisas que li na internet. Não sei se está escrito da forma correta, mas tentei fazer o melhor que consegui.
Espero que tenham gostado do capítulo.