Recovery - 16
Assim que aquele portão se abriu, o medo de serem apanhados, tornou-se ainda mais real para Valerie. O seu coração batia ainda com mais força, dando-lhe, por vezes, a sensação de que a qualquer momento lhe poderia sair pela boca. Ela tentou não pensar em nada, e fez aquilo que Ashton lhe tinha dito, começou a correr pela rua que existia em frente ao edifício. Virou a cabeça para trás, uns metros depois, vendo que Ashton vinha mesmo atrás de si. Um vislumbre da placa onde se lia Saint Anne, o nome daquele hospital psiquiátrico, surgiu no seu campo de visão, contudo ela logo desviou o olhar concentrando-se no facto de que precisavam de sair dali o quanto antes.
As ruas estavam completamente desertas àquela hora da noite, o silêncio preenchia a noite, silêncio esse apenas quebrado pelo som dos pés deles a embaterem no chão e pelas suas respirações cada vez mais ofegantes.
- Val… - chamou Ashton, depois de mais uns minutos passados a correr. Ele parou de correr e Valerie fez o mesmo. Sentia as suas pernas cansadas e fracas e só desejava poder sentar-se no meio do chão e ficar ali a descansar. – Acho que já podemos parar de correr, já nos afastámos do hospital. – ele disse por entre respirações entrecortadas.
- Não acredito que estamos cá fora. – foi a única coisa que a rapariga conseguiu dizer. Olhou para o céu, repleto de pequenas estrelas, assim como uma enorme lua. A brisa que batia contra o seu rosto fazia-a ter vontade de começar a rir-se às gargalhadas, tal era a alegria que começava a sentir. Os seus olhos encontraram os de Ashton e viu que ele estava já a sorrir.
- Vamos embora. – ele disse apenas e logo eles começaram a andar. Desta vez sem terem a necessidade de correrem, limitaram-se apenas a avançar de forma mais lenta pelas ruas e estradas que se estendiam à sua frente.
- Achas que vão dar já pela nossa falta? – perguntou Valerie, ao fim de uns minutos em que ambos permaneceram em silêncio, ficando apenas entregues aos seus pensamentos.
- Não, claro que não. – ele olhou-a de relance. – No meio daquela confusão toda, é impossível darem pela nossa falta. Talvez só o notem amanhã. – ele encolheu os ombros.
- Por essa altura já estaremos escondidos. – concluiu a rapariga de cabelos claros.
Os olhos de ambos focaram-se na visão que se estendia à sua frente, como o hospital se encontrava numa parte mais alta daquela cidade, a vista dali era bastante deslumbrante, especialmente quando era de dia, o que não era o caso. Agora apenas se viam as luzes dos candeeiros existentes nas ruas, assim como algumas luzes nas janelas das casas e apartamentos das pessoas que se encontravam ainda acordadas àquelas horas tardias. As luzes de alguns carros também se juntavam à grande quantidade de pequenas luzes. A vida continuava fora daquele hospital, coisa que não parecia acontecer quando se estava lá fechado, longe de tudo e de todos.
- Tinha mesmo saudades disto. – murmurou Valerie, tão baixo que por momentos achou que Ashton não tinha ouvido, contudo o facto de ele lhe responder, logo de seguida, mostrou-lhe exactamente o contrário.
- E eu. Quase me esquecia como é estar deste lado.
Os olhos de Valerie foram de encontro à figura de Ashton. Apenas o vislumbrava de perfil, o seu rosto bastante bem esculpido, emoldurado por uns rebeldes cabelos claros, os quais dava vontade de entrelaçar os dedos.
- Tu estavas naquele hospital há muito mais tempo do que eu. – ela voltou a focar os seus olhos no horizonte à frente deles. – Não consigo imaginar como aguentaste tanto tempo.
- Que poderia eu fazer? – ele perguntou, agora olhando para ela. Abanou a cabeça e um longo suspiro escapou-se por entre os seus lábios.
- Fugias. – ela disse, como se fosse a resposta mais óbvia de todas.
Ele abanou a cabeça. – Já me tinha passado pela cabeça muito antes de me teres falado disso, mas sabes que nunca pensei pôr isso em prática? Sempre pensei que fosse algo estúpido de se fazer e algo que nunca iria dar certo.
- É algo estúpido sim, mas por vezes as coisas estúpidas também dão certo. – Valerie disse, ao mesmo tempo que com o pé chutava uma pequena pedra que surgiu no seu caminho. Viu a mesma rebolar pela rua abaixo, até desaparecer do seu campo de visão.
- Tens razão, mas quando estamos ali dentro, há tanto tempo, quase acabamos por nos habituar.
- Eu nunca me iria habituar. – a rapariga murmurou, baixando o seu olhar por momentos. Continuava a achar que estar naquele hospital era um pesadelo tornado realidade, continuava a achar que ia ficar lá para sempre, pois na sua cabeça os seus pais iam acabar por se esquecer dela.
- Não sabes isso. – disse Ashton.
- E espero nunca vir a saber. – ela concluiu, deixando que os seus olhos fossem de novo de encontro à figura de Ashton, o rapaz estava já a olhar para ela, e ambos esboçaram um largo sorriso.
- Ainda falta muito para chegarmos ao sítio onde nos vamos encontrar com o teu amigo? – perguntou ela.
- Sim, um pouco. Mas quanto mais longe for daquele hospital, melhor é. – ele disse com um encolher de ombros.
Valerie apenas assentiu com a cabeça, sabendo que ele estava certo. Não se importava se tivesse de passar a noite inteira a andar, desde que isso significasse que ficariam o mais longe possível daquele hospital. Deu por si a olhar por cima do ombro, vendo que o hospital já há muito tempo que tinha deixado de ser visível. Tinha ficado para trás, cada vez mais longe, e Valerie desejava que isso continuasse para sempre. Não queria nunca mais voltar àquele lugar, preferia passar o resto da vida a fugir ao invés de estar fechada dentro daquelas quatro paredes.
Assim que o parque onde tinha combinado encontrar-se com Ben, ficou visível aos olhos de Ashton, ele deu por si a olhar em volta procurando dessa forma o amigo, que supostamente já estaria ali à espera deles. Sentia-se cansado do tempo todo que tinham estado a andar, mas para ele aquela era uma dor que valia a pena. Pelo menos agora já estavam mais longe daquele hospital e em breve estariam ainda mais.
- Onde é que ele está? – a voz de Valerie interrompeu os seus pensamentos e Ashton agarrou depois na mão dela começando a puxá-la com ele numa outra direcção. Uma figura alta começou a ser visível no seu campo de visão, e um meio sorriso de alívio apareceu nos seus lábios.
- Ali. – ele disse apenas, e Valerie seguiu o olhar dele até ao rapaz que se encontrava um pouco mais à frente.
Valerie concentrou a sua atenção no rapaz que estava agora à frente deles, analisando-o, como se quisesse dessa forma confirmar que ele era de confiança.
- Esta é a Valerie, e este é o Ben. – Ashton apresentou os dois, depois de cumprimentar o amigo.
- Olá. – ambos disseram ao mesmo tempo.
- Fico contente por terem conseguido fugir. – Ben disse logo de seguida, olhando depois em volta. Parecia que estar naquela situação, o deixava ligeiramente inseguro, apesar de ele não ter motivos para tal.
- Conseguiste tratar das coisas com o teu amigo? – Ashton apressou-se logo a perguntar.
- Claro. Ele não se importa que fiquem na casa dele. Ele vive sozinho, pouco tempo passa em casa e disse que não há qualquer problema em ficarem lá, o tempo que for preciso.
Um suspiro de alívio foi expelido por entre os lábios de Valerie, que continuava a olhar de forma atenta para o rapaz que estava à sua frente.
- É muito longe daqui? – decidiu perguntar.
- Um bocado, é na outra ponta da cidade.
- Mas isso é bom para nós. – apressou-se Ashton a acrescentar. – Quanto mais longe for, mais seguros nós estamos. – encolheu os seus ombros e esboçou um pequeno sorriso, que era unicamente dirigido a Valerie.
- Eu tenho ali o meu carro, é num instante que lá chegamos. – disse o outro.
Valerie e Ashton apenas assentiram com a cabeça, e rodando nos calcanhares, Ben começou a caminhar em direcção ao seu carro. Os outros dois apressaram-se a segui-lo, olhando sempre para um lado e para o outro, tendo sempre o receio de serem apanhados apesar de saberem que isso não iria acontecer. Pelo menos, não hoje.
A viagem de carro foi rápida, tal como Ben havia dito, e foi praticamente passada em silêncio. Esse silêncio apenas era quebrado pelas vozes de Ashton e Ben, quando de vez em quando falavam sobre um qualquer assunto banal.
Valerie limitava-se a olhar pela janela, vendo as casas e a paisagem do lado de fora passarem por ela a grande velocidade. As luzes preenchiam aquela noite, muito diferente de todas as noites anteriores, em que ela tinha permanecido fechada no hospital. Apertou contra si a mochila que tinha as suas coisas e deu um pequeno sorriso. Queria muito acreditar que tudo iria correr bem.
O carro parou ao fim de uns minutos e os três saíram do mesmo. Valerie mantinha-se perto de Ashton, pois era a única pessoa ali que ela conhecia, e como tal, a única em quem ela tinha confiança.
Um outro rapaz logo saiu da casa onde eles tinham parado, era uma casa branca não muito grande, com um pequeno jardim à frente. Valerie afastou os seus olhos da casa e focou os mesmos no rapaz que aparecia agora. Era bastante alto, mais alto que os outros dois, bastante moreno e com uma barba de dois dias a cobrir parte do seu rosto.
- Ian. – disse Ben, como forma de cumprimento. O rapaz sorriu, olhando depois para Ashton e Valerie, os quais foram de imediato apresentados.
- Fico contente por poder ajudar. – Ian falou seguidamente. – E fiquem à vontade. Os amigos do Ben são meus amigos, portanto… - ele encolheu os ombros e sorriu para Ashton e Valerie.
- Muito obrigado a vocês os dois por nos estarem a ajudar. – Ashton disse.
- Bem, é melhor eu ir embora. Fiquem bem e qualquer coisa, sabes o meu número. Eu depois vou passando por aqui. – Ben retorquiu olhando para o outro rapaz loiro.
Este assentiu com a cabeça e os três ficaram a ver Ben a abandonar aquele local. Valerie deu por sim a aproximar-se mais de Ashton, deixando que o seu braço tocasse no dele e depois de Ian dizer para entrarem, eles seguiram atrás do rapaz para o interior daquela casa.
Pronto, já podem tirar todas as dúvidas que tinham sobre se eles iam conseguir fugir ou não! Neste capítulo está a resposta para isso ahaha. Bem, agora eles estão "livres" mas como é óbvio não estão seguros e tudo pode acontecer.
Espero que tenham gostado do capítulo!
Beijinhos