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More than words.

More than words.

Recovery - 26

If only

 

Os dias iam passando e tal como Valerie tinha imaginado, estar ali dentro agora era ainda pior. Ela passava os seus dias entre o quarto, o refeitório e a sala de convívio e todo esse tempo era passado sozinha. Antes ficava na companhia de Ashton, mesmo que muitas vezes não a desejasse e apenas quisesse ficar sozinha, mas agora mesmo que quisesse a companhia de alguém ela não a tinha.

O tempo passava ainda mais lentamente do que antes, os dias arrastavam-se uns atrás aos outros e ela já nem se dava ao trabalho de tentar perceber quantos dias se tinham passado, já eram tantos que o mais certo era perder-lhes a conta caso os tentasse contar.

Algumas vezes via Ashton num corredor ou em algum outro sítio, e quando os olhares dos dois se cruzavam, aparecia sempre alguém que a levava para outro lugar longe do rapaz. Ela sabia que Ashton estava a ter uma espécie de castigo por, supostamente, ser o responsável pela fuga e a verdade era que aquilo partia um pouco mais o coração de Valerie. Ele não tinha culpa nenhuma naquilo, fora ela quem insistira para fugir, mas agora era ele quem estava a pagar as consequências dos atos dela.

A rapariga avançou pelos corredores, que continuavam a parecer não ter fim, e enquanto andava ia olhando para as placas azuis que se encontravam ao lado de cada porta e que informavam o que era cada uma das divisões. Ela parou de andar quando chegou àquela que lhe interessava e que andava à procura e bateu lentamente na porta. Esperou até ouvir uma voz do outro lado e depois abriu a porta e entrou no interior daquele escritório.

- Fui eu que tive a ideia de fugir e pedi ao Ashton para me ajudar. – ela apressou-se logo a dizer, sem deixar que a mulher que estava à sua frente tivesse tempo de abrir a boca para lhe perguntar o que é que ela estava ali a fazer.

Valerie tinha passado os últimos dias sempre a pensar naquilo, a sentir-se mal por Ashton estar a ser culpado de algo que ele não tinha culpa, a culpa era dela e por isso o mais certo era ser ela a sofrer as consequências.

- Valerie, não precisas de estar a dizer isso apenas para o protegeres.

A rapariga de cabelos claros abanou a cabeça e deixou que um longo suspiro fosse expelido pelos seus lábios.

- Eu não estou a tentar protege-lo, eu estou a dizer a verdade. Fui eu e não ele.

- Valerie…

- Ele é que está a tentar proteger-me! Isto não é justo, fui eu que lhe falei, foi por minha culpa que nós fugimos. – ela insistiu.

- Não precisas de fazer isso, a sério. – a mulher disse num tom de voz cansado e exasperado e Valerie sabia que não lhe ia adiantar de nada estar a insistir naquilo, porque nunca ninguém iria acreditar nela.

- Não é justo. Espero que um dia se arrependam do que nos estão a fazer! – ela protestou e sem esperar qualquer resposta, virou costas e abandonou aquela divisão, tendo a atenção de bater a porta com toda a força antes de começar a percorrer os corredores de novo. Já que a tratavam como se ela fosse uma maluca, talvez ela pudesse começar a agir como uma também.

 

“ 08 de Junho, 2015

Faz hoje um ano que tu morreste. Um ano. Como é possível que já se tenha passado tanto tempo? Continuo a não conseguir acreditar que estás morta, ainda parece algo demasiado irreal. Continuo à espera de ouvir a porta abrir e ver-te, ouvir as tuas gargalhadas e sentir os teus braços em volta do meu corpo para me tentares consolar do ano que já se passou.

É tão difícil viver sem ti, nunca tinha pensado como seria se um dia ficasse sem ti, porque na verdade era algo que eu nunca pensei que pudesse acontecer. Mas aconteceu e eu continuo a não saber como se consegue viver sem a pessoa de quem mais gostamos no mundo. Acho que nunca ninguém pensa nestas coisas até elas acontecerem. Mas mesmo que pensássemos, nunca estaríamos preparados, não achas?

Ainda estou viva e não sei como, porque eu continuo a querer morrer, e essa minha vontade cada vez se torna maior. Desculpa-me por pensar desta forma e desculpa-me por ser tão fraca, por favor.”

 

 

Ashton sentia-se cada vez mais cansado de tudo aquilo, agora nem sequer podia ter a companhia de Valerie, que nos últimos tempos tinha sido a única coisa que o tinha distraído da porcaria de vida que ele tinha. As drogas e o álcool tinham até começado a ficar escondidos num recanto da sua mente, porém parecia que agora todos os pensamentos relacionados com essas coisas tinham voltado a apoderar-se da sua mente. Ele odiava aquilo e odiava ainda mais saber que não podia fazer nada.

Estava sempre a ver Valerie contudo esta desaparecia sempre de forma rápida do seu campo de visão, como se o facto de eles se verem um ao outro fosse uma espécie de crime. Será que todos ali pensavam que eles eram assim tão burros ao ponto de tentarem fugir de novo? Estavam muito enganados.

Aproveitando que estava sozinho, Ashton caminhou pelos corredores, sempre de forma atenta para ninguém o ver, até ao quarto que pertencia a Valerie. Já se tinham passado muitos dias desde que eles tinham voltado para o hospital e desde essa altura que não tinham voltado a falar. Ashton queria pedir-lhe desculpa de novo, queria uma oportunidade para lhe contar tudo o que tinha acontecido, queria que ela o desculpasse, queria ficar bem com ela, sentia a falta de Valerie.

Depois do acidente ele tinha acabado por ir a um psicólogo, coisa que os pais nem sequer tinham ficado a saber, porque isso implicava contar-lhes do acidente e o rapaz tinha medo. Muito medo. As consultas com o psicólogo não o ajudaram muito porém serviram para Ashton desabafar, ele sentia uma necessidade tão grande disso naquela altura. Ele tinha contado tudo e o homem para quem ele tinha falado durante horas seguidas tinha apenas dito a Ashton que ele não tinha culpa. Não tinha a culpa toda, porém o rapaz achava sempre que sim e nada nem ninguém iria conseguir tirar-lhe isso da cabeça.

Ashton parou em frente da porta do quarto de Valerie e bateu duas vezes à mesma, aguardou uns minutos e como não obteve resposta, ele voltou a bater mais algumas vezes. Apesar de ter depois percebido que ela não estava ali, ele continuou por mais uns bons minutos à porta daquele quarto. 

Esses longos minutos de nada serviram, porque ela não aparecia e então Ashton saiu dali de novo.

 

Os dias a seguir ao acidente foram um autêntico pesadelo. Eu não conseguia tirar aquela imagem da minha cabeça por mais que quisesse que isso acontecesse. A culpa tinha-se apoderado de todo o meu corpo e haviam até alturas em que eu me sentia paralisar. Parava de fazer o que quer que estivesse a fazer no momento e era capaz de ficar horas apenas a olhar para o vazio. A minha mãe acabou por perceber que algo não estava bem, visto que isso era bastante óbvio, mas por mais que ela tentasse perguntar-me o que se passava, eu limitava-me a fugir a todas as suas perguntas.

Eu não conseguia ir sair à noite com os meus amigos, eu tinha medo que tudo aquilo voltasse a acontecer, apesar de as probabilidades disso serem mínimas. Para além disso também tinha medo que fossemos apanhados e eu não queria que isso acontecesse. 

As noites eram horríveis e eu não conseguia dormir, pois sempre que fechava os olhos eu revivi-a tudo aquilo de novo. Sentia-me ficar em pânico e sem ar. Mais tarde acabei por perceber que aquele acidente foi a causa do início dos meus ataques de pânico, que com o passar dos dias iam-se tornando cada vez piores e mais frequentes. Era horrível. Eu tentava refugiar-me no álcool e nas drogas, porém no estado em que eu estava já nem isso me ajudava e eu apenas ficava pior. Eu estava a cair num buraco sem fundo e sentia que nada nem ninguém me iria conseguir tirar dali. A minha vida tinha deixado de fazer sentido, eu sentia-me completamente perdido e só queria que tudo voltasse a ser como era antes do acidente. 

Os meus pais começaram a achar que tudo aquilo se devia às drogas e ao álcool e acabaram por me pôr num centro de desintoxicação. E eu não protestei quando eles fizeram isso, eu sabia que era o melhor para mim, eu achava que depois teria a minha vida normal de volta, porém isso não aconteceu. Quando saí de lá consegui manter-me afastado da má vida por uns tempos no entanto, os ataques de pânico continuaram e eu voltei a refugiar-me nas drogas e no álcool. Os meus pais já não sabiam o que fazer comigo e eu sinceramente também não. Foi nessa altura que surgiu a hipótese do hospital psiquiátrico e apesar de por dentro eu ter gritado com todas aa forças que não queria ir para lá, a verdade é que fiquei calado.

Eu não sabia o que fazer, só queria esquecer aquela parte da minha vida, queria esquecer o acidente, queria afastar-me das drogas e do álcool e queria que os ataques de pânico parassem.

Quando eu e a Valerie fugimos do hospital, por momentos em comecei a achar que a minha vida estava a começar a fazer algum sentido. O acidente estava agora num recanto esquecido da minha mente, as drogas e o álcool também estavam fora da minha vida e os ataques de pânico também já não andavam a acontecer. 

Mas quando Valerie ouviu aquela conversa ao telefone, eu senti a minha vida desmoronar-se outra vez. Senti todos aqueles progressos irem por água abaixo. Senti que tinha perdido Valerie, a única pessoa que, mesmo não sabendo, me tinha ajudado imenso.

 

Aqui está o penúltimo capítulo! Nem acredito que isto está quase a chegar ao fim. Bem, decidi colocar aqui mais um flashback do Ashton, isto porque vocês sabem muito sobre a vida de Valerie, já que a história toda se focou sempre mais nela do que no Ashton, e então achei que deviam saber também mais coisas sobre ele, em especial como ele se sente com todas estas coisas.

Bem, no fim de semana eu publico o último capítulo, e depois na próxima semana o epílogo!

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